sábado, 2 de março de 2013

AO VOVÔ

Foto: Marilu Pimenta

Ontem você se foi. Se foi do nosso dia a dia, da sua poltrona na sala, da mesa do truco com os amigos. Se foi da calçada, do banco da praça, da coxinha com coca cola, seu cardápio favorito. Ontem você se foi, mas não foi embora da gente. Ficou inteiro aqui no nosso coração. Das lembranças dos nossos almoços de domingo. Nas festas e danças com a vovó. Das lembranças de suas histórias tão ricas em memórias e lucidez. Ficou a sua integridade, honestidade e dignidade em cada filho, como orgulho e exemplo em cada neto. Aos bisnetos, ainda jovens e os que ainda não vieram, contaremos o grande homem que foi durante seus praticamente cem anos. Isto não é pouca coisa. Viver um centenário sem manchas, sem situações que te retirem o respeito dos outros, é coisa rara. Nem o seu jeito bravo, a teimosia, a dificuldade em abraçar e demonstrar afeto, tiram de você a certeza de ter sido amável e carinhoso ao seu modo. Confesso que muitas vezes senti falta de lembranças em colo de avó, de abraços apertados, coisa minha. Mas você, vovô, foi o meu único avô e muitas vezes o pai que a minha mãe não teve o direito de conhecer. E isto nos fazia amá-lo ao nosso modo, as vezes tão cheio de dificuldades de aproximação, de afeto, sem saber se o senhor gostaria ou não, mas tão cheio de vontade de acolhê-los em nossos braços a cada momento. Um grande homem, um grande exemplo, que não se perde com a morte. Ela não é capaz de levar embora uma vida tão rica em conteúdo e boas lembranças. Em cada filho, está muito de você. As vezes no temperamento um pouco difícil, mas acima de tudo, nos grandes homens, pais e mães, que eles só são capazes de ser através do exemplo que o senhor e a vovó foram capazes de dar. Em nós, netos, fica um desejo enorme de que nossos pais possam viver tanto e tão bem quanto o senhor. Um desejo que parece um grito de socorro, pra que nenhum deles vá embora antes do tempo, este tempo longo, centenário, que você nos ensinou que é capaz de acontecer com vitalidade, lucidez e saúde. Tomara Deus que ouça as nossas orações e dê a eles um pouco desta genética e desta vida regrada, sem vícios, que o senhor foi capaz de ter. Ontem você se foi, fisicamente apenas, porque seu corpo pediu descanso. Os ossos, os músculos, os órgãos, tudo precisava descansar num repouso eterno, sabemos disto. Sua alma, embora amasse viver, talvez estivesse também cansada de tantas histórias, lutas, desafios, conquistas e tanta vida. E então, chegou a hora. Ficou a gratidão eterna a Deus pela sua vida e tudo o que vivemos juntos. Ficou a saudade que vez ou outra baterá mais forte mas será confortada pelas boas lembranças e pelo amor e convívio entre cada um de nós, frutos da sua vida. Ficou muito mais do que foi, vovô. Pode ter certeza. Fica as memórias das nossas conversas, a minha cabeça de banana, a nossa última conversa ainda que curta, embora eu seja a faladeira, como o senhor mesmo concordou. Obrigada por esperado meu casamento, por ter vindo algumas vezes em minha casa e por rirmos algumas vezes de suas histórias. Obrigada por tudo, vovô. E não tenha dúvidas de que te amei muito e ainda amo no meu coração. Meus filhos, que ainda nem vierão, saberão quem você foi e o terão como exemplo, pode ter certeza disto. Agora, descanse em paz, porque viveremos e faremos o possível para que nossa vida valha tanto a pena quanto valeu a sua.

Um comentário:

  1. Ele, com certeza, receberá essas vibrações de amor e respeito. Muito lindo o texto e o afeto pela memória de seu avô. Bjs

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